Os parques nacionais brasileiros são protegidos por uma lei de 2000. A prática veio antes da lei, o que permitiu que as unidades de conservação (dentre eles 46 parques nacionais) fossem se espalhando pelo Brasil antes mesmo que parássemos para definir uma lei para protegê-las de uma forma mais universal. Não fosse isso, grande parte dos 74 parques poderia não ter sido criada e muito já poderia ter sido perdido.
Os parques nacionais destacam-se de outras unidades de conservação por permitir o uso público, que é a visitação com recreação, interpretação ambiental, turismo, esporte, entre outros. Nem todos os parques têm um uso público implementado amplamente, mas todos permitem esse uso.
É isso que fazemos todos os dias: uso público de parques nacionais, às vezes também estaduais e em propriedades privadas de conservação. Não somente para usar e nos divertir, mas para entender as relações, questões e oportunidades do parque, divulgar e permitir que seja criado um ciclo positivo de conservação.
Hoje temos 26,7 milhões de hectares, pouco mais de 3% do nosso território, como área de parques nacionais. Pode parecer muito, mas vale lembrar que o Brasil é o país com maior biodiversidade do mundo. Segundo a ONU, temos 15% a 20% da biodiversidade mundial. Além disso, temos muitas espécies não encontradas. Estima-se que levaríamos 2 mil anos para descobrir todas as espécies do Brasil.
Grande parte das áreas dos parques nacionais não foi regularizada fundiariamente, os proprietários não foram indenizados pelas expropriações e, enquanto isso, seguem utilizando a terra para diversos fins. Muitos adotam as diretrizes de conservação, outros tantos mantêm suas lavouras, há também "florestas plantadas" (termo usado para cultivo de árvores como eucaliptos e pinos) e gado. É um ciclo perverso que não permite que o ICMBio atue efetivamente na área dos parques e faz com que a conservação não seja efetivamente colocada em prática.
Como se não bastasse, temos em média 1 funcionário para cada 11 mil hectares de parque nacional. É como se cada funcionário fosse responsável por mais de um quilômetro quadrado em termos de: prevenção e manejo de fogo, apoio à pesquisa científica, desenvolvimento e gestão de ecoturismo, fiscalização, e uso público.
Este último muitas vezes acaba sendo preterido, pois os outros são mais urgentes e requerem maior atenção imediata. Afinal, não temos cultura de valorizar nossos parques nacionais e geramos pouca demanda, com isso há pouca pressão de melhoria. Mas, se bem implementado, é justamente o uso público que pode fazer que o parque ganhe força, reconhecimentos e aliados para as demais atividades.
Você se sensibiliza mais com uma área queimada próxima a uma cachoeira que você já visitou ou uma área da qual você nunca ouviu falar e onde não tem qualquer relação afetiva com o local ou suas pessoas?
O uso público, além de trazer benefícios diretos aos usuários em termos de saúde física e mental, traz benefícios indiretos para toda a sociedade e meio ambiente, gerando empregos, colocando mais pessoas em circulação nas trilhas e, com isso, afastando garimpeiros, caçadores, extrativistas, entre outros.
Os funcionários em tempo integral e temporários de parques nacionais são verdadeiros guerreiros que contam com apoio de uma rede de pessoas para realizar seu trabalho: guias, RPPNs, pesquisadores, entusiastas e ecoturistas.
Sim, ecoturistas ajudam nesse ciclo. Ao visitar uma unidade de conservação você se transforma: aprende de onde vem sua água, entende a relação entre a biodiversidade e sustentabilidade, o que significa uma queimada, o que significa uma árvore de pé, um cupinzeiro que acende com vaga-lumes, uma ave que se reproduz somente nesse local. E toda a relação que isso tem a ver conosco, seja na cidade ou no campo.
Ao aprender a relação da natureza, o ecoturista ajuda no ciclo de conservação, seja reduzindo o uso de recursos em suas casas ou atuando diretamente nos parques em monitoramento, voluntariado, combate ao fogo, entre tantos outros. O ecoturista também acaba advogando pelas unidades de conservação e atrai mais pessoas para ele.
No Brasil dois parques nacionais já foram extintos para construção de hidrelétricas nos anos 80: Sete Quedas (PR), coberto pelo lago da barragem de Itaipú, e Paulo Afonso (BA), para a construção da barragem de mesmo nome.
Em 2018 o STF decretou que áreas protegidas somente podem ser reduzidas através de lei, o que minimiza, mas não impede que isso ocorra novamente. São atitudes irreversíveis e até impensáveis, mas que nossa história tem mostrado que são possíveis de acontecer.
Quanto mais usados os parques, menor a chance de isso se repetir no futuro. A proteção aos parques é vital para a sociedade urbana e rural, e pode ser feita através da recreação, do uso público. Nas suas próximas férias ou feriado, considere ir a uma unidade de conservação para fazer parte dessa transformação.
Todas as fotos deste post foram tiradas no Parque Nacional da Ilha Grande, que fica entre MS e PR ao longo do último trecho existente do Rio Paraná sem barragens. Esse parque foi criado em 1997 na área remanescente do extinto Parque Nacional das Sete Quedas.