Ah, se todos os sonhos fossem fáceis e rápidos de serem alcançados, se todas as nossas vontades fossem realizadas num piscar de olhos e se tudo o que desejássemos nos fosse trazido sem tantos esforços… que chato seria a vida né.
Concordo com a teoria que diz que quanto maior o esforço para atingirmos um objetivo mais prazer temos ao conquistá-lo. A natureza humana requer que a gente seja constantemente desafiados. Não sei se consciente ou inconscientemente, o fato é que essa teoria move minha vida há muitos anos.Sempre sonhei em escalar o K2. Só existem 14 montanhas nesse planeta acima de 8.000 metros. E de longe o K2 era o 8.000 que mais me atraía.
Foram 4 anos tentando. Em um ano, não consegui patrocínio. No outro, tive que trabalhar pois recebi uma proposta do Discovery Channel. Depois o Discovery quis renovar para outro projeto novamente e por fim, eu tive Doença de Lyme e passei por um ano de tratamento intenso para amenizar os sintomas.
Enfim, olhando de fora as pessoas vêem e pensam: "Mais uma mulher que escalou mais uma montanha". Mas eu finalmente fechei uma série, de 3 Docs, onde vou mostrar em detalhes, os bastidores dessa expedição.
Pra quem não sabe o Paquistão é um dos países mais restritos do mundo e ainda fomos pra uma região de tríplice fronteira (India, China e Paquistão) que é Zona de Conflito e disputa com a India. Para ilustrar o que estou falando existem "apenas" 22 postos de controle militar para chegar de Skardu ao campo base do K2.
Para tirar o visto há requisitos como: pegar um voo para Brasilia e perder 1 dia inteiro de trabalho para fazer uma entrevista pessoal. Fui entrevistada por mais de 2 pessoas que questionaram porquê aos 37 anos ainda não era casada ... Meu passaporte brasileiro ficou retido por tempo indeterminado lá para eles avaliarem se me cederiam o visto de 90 dias pra escalar o K2. Mas deu certo...
Como se não bastassem os desafios, recebi mais um um "não" após convidar meu parceiro de escaladas, o Pemba Sherpa, com quem já havia escalado 2 vezes o Everest (em 2013 pela face Sul), (em 2017 pela Face Norte). Me disse que achava muito arriscado escalar o K2 e que não valia a pena o risco. Eu só pude respeitar...
E começar a quebrar a cabeça pra pensar em quem poderia ser meu parceiro nessa empreitada... Não conhecia muitas pessoas que tivessem capacidade técnica e vontade de escalar a montanha mais mortal da Terra dentro de poucos meses.
E como ainda estava me curando de Doença de Lyme, e com a imunidade e a capacidade física comprometidas, realmente não considerava a possibilidade de embarcar sozinha pra essa expedição.
Estava com um grupo de mais de 20 pessoas na India e de lá seguiria pra Islamabad. Tive que brigar pra varar uma barreira militar para poder voltar a Delhi pós uma enorme nevasca. Só cheguei em Islamabad 2 dias depois que o restante da equipe já havia partido rumo ao campo base.
Nisso, meu parceiro Maximo, voltava de um trekking ao campo base com alguns clientes. Nos encontraríamos em Urdukas. Mas eu estava atrasada. Max não sabia nem se eu já estava no Paquistão. Se havia desistido da expedição... Ele sabia pela equipe de base dele que não tinha conseguido sair da India.
Por ser uma região extremamente remota, trata-se de um dos poucos lugares do mundo onde o serviço bidirecional do SPOT X não está disponível, esse fato aliado à nevasca na India e as chuvas intensas nessa região da Caxemira dificultavam nossa comunicação. Começávamos a expedição de modo tranquilo (risos).
Como se não bastasse ao chegar em Islamabad uma confusão de horários da agência com que marquei o voo, não consegui voar pra Skardu.
Embarquei, um trecho que normalmente dura 8h durou quase 16 horas pois uma rocha gigante rolou e bloqueou a estrada segundos antes de passarmos.
Precisamos usar uma britadeira e dinamitar a pedra. Sim, explodimos a pedra com dinamite para quebrá-la em pedaços menores pra liberar a estrada e prosseguir. A estrada além de super sinuosa é tao estreita que passava 1 carro por vez. Apenas 4X4 preparados conseguem fazer esse trecho. Eles levam alavancas, pás e dinamite para poder abrir a estrada e seguir caminho.
Chegamos exaustos em Askole e não pudemos nem dormir. Como estavam atrasados eles começaram a trilha imediatamente e ainda fizeram o percurso que seria pra ser feito em 2 dias em 1.
Andamos 16 horas de Askole a Paiju e fomos diretamente pro o 2o acampamento no 1o dia de trekking, onde teoricamente era para ser tranquilo, de aclimatação.
Enquanto isso, Max esperou por 3 noites por mim em Urdukas sem saber nada sobre meu paradeiro e ele acabou ficando sem comida, já que a logística era eu levar.
Em Urdukas, encontrei com Max e seguimos pra Goro. Avistamos o K2 chegando em Concordia. Meu Deus, que montanha. Dá pra entender porque a chamam de " A Montanha"!
Ao chegar no campo base conhecemos escaladores de outros países que dividiriam a logística de campo base com a gente. Quase todos estavam na 3a ou 4a tentativa de escalar o K2. E em breve, conto mais pra vocês dessa baita expedição que em breve, virará uma serie especial pro Canal OFF.