O relato a seguir foi enviado pela usuária do SPOT Gen3, Valéria Caselato, usuária do SPOT Gen3 que teve um pouso irregular e precisou de um resgate na cidade de Luis Eduardo Magalhães, na Bahia.
Decolei por volta de 12:15 hs do dia 12 de outubro de 2018, para a tentativa de 300 km pré-fixados com o planador modelo Standard H201B Libelle, prefixo PT-PAV, de minha propriedade. Teria que passar em dois pontos (Suave e Segadeira, nomes fictícios para coordenadas específicas) e retornar para o aeródromo municipal.
Já havia cumprido o primeiro ponto e me encaminhava para o segundo. O dia já estava terminando e as térmicas estavam mais fracas. Enfrentava no percurso de Suave para Segadeira um vento de proa, que me fazia ao subir as térmicas, voltar um pouco para trás, isso me dificultava o planeio para frente.
Chequei no segundo ponto, com 1.100 m de altitude, e ainda consegui subir mais 100 m, entretanto, ao chegar neste ponto e num raio de 15 km, só havia uma mata, e a única pista de pouso próxima era na usina, onde ficava o segundo ponto. Ao avistar no norte, direção do destino que deveria seguir, vi uma fumaça e uma nuvem que me possibilitaria subir mais e chegar ao aeródromo, a 80 km de onde eu estava. Tomei a decisão de seguir em frente e alcançar esta nuvem, mas no caminho passei por muitas descendentes, o que me fez chegar uns 3 km antes, com a altura de 700 m.
Nesta situação, já observava no solo possíveis locais para pouso. Não havia opções boas, somente alternativas como três pivôs (áreas irrigadas de formato circular) abandonados e a mata. Para um pouso sem acidente, a mata era o pior local, pois as arvores com certeza danificariam muito o planador. Os três pivôs avistados, seriam uma opção menos pior. Escolhi o ultimo, pois estava mais claro, com menos arvores, e alguns bois no canto. O pivô estava abandonado, e tinha uns 1,2 km de diâmetro. Escolhi a parte que ficaria mais longe do gado.
Fiz os procedimentos de pouso e tudo correu bem, não houve danos ao planador e nem a mim, embora neste local houvesse muitos cupinzeiros altos e grandes (em torno de 1,5 m), e caso eu batesse em um deles, seria um grave acidente. Ao realizar o procedimento de pouso, verifiquei que havia algumas casas, e resolvi caminhar até elas. Já era 17:10h, e o por do sol seria em menos de uma hora. Então fechei o planador, peguei meu celular (não havia nenhum sinal), e caminhei muito até chegar nas casas. Mas elas estavam abandonadas. Andei mais um pouco, mas não encontrava nada, e resolvi que o mais seguro seria voltar ao planador e ficar lá abrigada.
Como era longe, quando retornei ao pivô, já estava escuro, devo ter andado uns 5 km. Meu celular estava com pouca bateria, e tinha deixado o SPOT dentro do planador. Caminhei no escuro, utilizando a bússola e lanterna do meu celular, até que encontrei o planador. Ao chegar nele, senti uma picada na perna, e no escuro não consegui ver que tipo de animal tinha sido. Começou a doer e inflamar e então, pensando na minha integridade física, resolvi acionar o SOS do SPOT. Para amenizar, passei saliva na picada e fiquei aguardando algum sinal de resgate. Às vezes com o rádio do planador chamava identificando meu prefixo e perguntava se alguém me escutava. Nenhuma resposta. Permaneci o tempo todo dentro da cabine.
Por volta de 22 horas, vi que havia uma luz ao longe, e pensei que aquela luz não estava lá. Peguei meu celular e comecei a balançar. Depois fiquei piscando com a luz do celular. Foi aí que ouvi alguém me chamar. Chegou a equipe do voo a vela, que ajudava no aeródromo: Daniel, Isaías e Rodrigo, para me resgatar!
Eles seguiram a ultima localização enviado pelo SPOT. Desmontamos o planador com a luz do carro e saímos do pivô, devagar, por causa dos bois, buracos e cupinzeiros. Chegamos em Luis Eduardo Guimarães às 2:30 h, e fomos comer algo, porque minha ultima refeição tinha sido o café da manhã. Foi uma aventura intensa, e o meu resgate só foi possível por causa do SPOT.
Como presidente da Federação Brasileira de Voo a Vela – FBVV, tenho recomendado que em campeonatos e voos em locais remotos sejam utilizados localizadores individuais, para facilitar os eventuais resgates.
Tenho apenas uma crítica a fazer… A Central GEOS, acionada pelo SOS do SPOT, entra em contato com as autoridades locais para efetuar o resgate, e essas não fizeram a operação por estar escuro. Se eu tivesse sido picada por uma cobra, escorpião, ou me ferido gravemente, o resgate pelas autoridades locais não teria tido sucesso no dia seguinte. Nossas autoridades tem que melhorar a estrutura de salvamento e resgate daqueles que precisam, a qualquer hora. Disso podem depender vidas.